🌴🌿Entre palmeiras e oliveiras: um coração dividido pelo Atlântico
- M.S.Vieira
- 12 de ago.
- 2 min de leitura

Há dias em que o interior de Portugal me devolve o cheiro da minha rua no Brasil. Não sei se é o vento frio que chega das serras ou o café recém-passado na cozinha, mas há momentos em que o mapa se dobra e dois países cabem na mesma aldeia.
Aqui, o Brasil aparece de forma mais sutil — não precisa de grandes festas ou multidões. Ele surge no calor de uma conversa na feira, na fruta madura que alguém trouxe do quintal, no abraço largo que estranha o protocolo europeu. Há algo de nosso jeito tropical no modo como alguns vizinhos nos olham, curiosos, e logo puxam papo, como se já nos conhecessem há anos.
O contraste, porém, é onde mora o encanto. No Brasil, o verão era um grito; aqui, é um suspiro entre campos verdes e oliveiras. As praias estão longe, mas os rios e ribeiras fazem festa nas pedras, com uma música que dispensa caixa de som. E no outono, quando as folhas pintam as ruas de cobre, lembro que a saudade também pode ter cor.
O mais curioso é que o Brasil não se perde aqui no interior: ele floresce de outra forma. Está no pão de queijo que perfuma a cozinha nos domingos, no sotaque que se mistura com o “pois” dos vizinhos, na panela que ferve feijão enquanto lá fora o frio pede mais uma manta. É como se o Atlântico fosse apenas um rio largo — e nós, os que atravessamos, fôssemos pontes vivas.
Entre as paredes antigas de pedra e a memória quente do meu país, encontro uma beleza híbrida: feita de oceanos que não dividem, mas misturam. E talvez seja isso que nos mantém inteiros — descobrir que não é preciso escolher um lado, quando podemos viver no meio do abraço.
Na minha terra havia palmeiras que balançavam como se conversassem com o vento. Aqui, são oliveiras silenciosas, guardiãs do tempo. Na minha terra havia sabiás que cantavam antes da chuva; aqui, o silêncio da tarde é o que anuncia o outono. E embora a saudade me empurre para trás, sei que o caminho de volta já não existe — ficou preso no calendário dos dias que não voltam.
Resta-me escrever com as duas paisagens dentro de mim: uma feita de sol que não se cansa, outra de neblina que me ensina a ficar. E talvez seja nisso que se esconda a beleza — não no regresso, mas no saber ficar onde a vida, sem pedir licença, decidiu plantar-me.
E você, já encontrou pedaços do seu país em terras distantes? Ou deixou que o lugar onde vive agora plantasse novas raízes dentro de si? Conta-me nos comentários — quero ouvir as suas histórias.
😀
Sim, acho que viver como imigrante pode ensinar a apreciar uma cultura muito diferente e ao mesmo tempo a própria mais do que antes. Isto, talvez, sem nunca abandonar a esperança de poder reconciliar os dois mundos.
Belíssima descrição de um sentimento que creio ter passado pelo coração de todo imigrante.